Já não o faço há algum tempo! Aquela vontade inexplicável de exteriorizar ideias, sentimentos, valores, um infinito número de conceitos numa sucessão de caracteres abandonou-me por largos meses. Sinto que ainda não voltou por completo. Às vezes dou por mim a olhar para o infinito, e sinto a escrita longe. Um vazio estranho e de certa forma irritante. Aguardo momentos e reflito por alguns instantes, mas nada. Não há nada que nos ocorra, nada que valha a pena dar ao mundo. Por momentos sentímo-nos inférteis. Depois dá-mos por nós a questionar o porquê! Porque é que não tenho nada de especial para contar!? Será que estou a ficar decrépito? Será que a capacidade criativa tem prazo de validade e a minha já se esgotou!? É engraçado, mas esta parte dos porquês dá lugar a um correr de ideias parvas, e questões ainda mais infundadas, até que a certa altura a gente já se diverte com o facto de não ter nada para contar. A dado momento, o ridículo de não saber o que se há-de dizer, a frustração do vazio, dá lugar a risos parvos, que nos saem compulsivamente e cuja origem e porquê a gente não consegue explicar. De que te ris? Perguntam-me as pessoas que ocasionalmente me rodeiam. Ao que eu respondo de maneira evasiva, inventando uma desculpa supostamente divertida para o caso, mas preservando sempre a verdadeira razão para mim. É engraçado, mas a maior parte das vezes que rio a situação é banal. Ou um trocadilho estúpido, ou uma situação parva, enfim... A piada quase sempre se esconde no movimento ininterrupto da vida. Quando a gente está profundamente triste, por causa de um acontecimento qualquer, quando damos por nós com um sentimento desagradavel que não sabemos explicar bem de onde surge, lá vem um político que se engasga, um treinador de futebol que dilacera os alicerces da língua portuguesa. E a gente ri. Ri até se cansar. Fica depois, num modo reminescente a remoer a graçola, a repetir sozinho a situação que encerra em si uma comicidade genial. É verdade que há muitos bons humoristas, capazes de construir habilmente uma sucessão de eventos cómicos, com talento suficiente para roubar risos a plateias inteiras, mas a gente na verdade nunca ri da mesma maneira! Ao fim de dois ou três episódios de uma determinada série, de um determinado programa de stand up já conseguimos antecipar as piadas que eles estão a construir. O acaso da vida, o parvo do quotidiano, é o humor no seu estado mais puro. Um gajo que apressado se desiquilibra e cai das escadas. Uma gaja de saltos altos a caminhar com ar supostamente gracioso escorrega numa casca de banana, qualquer imprevisto deste tipo é sucedido de uma vontade de rir surpreendente. É verdade que é rir da desgraça dos outros, mas convenha-se que é uma desgraça muito divertida e com muito pouco de trágico.
A escrita serve para muito muito mais. O diário, papel de jornal, revista, são uma espécie de elixir da alma. Quando acabamos de escrever algo, por muito medíocre que seja, por muito desinteressante que nos possa parecer, temos sempre a sensação de termos criado algo. Conseguir criar mundos, cruzar ideias e filosofias, construir teorias e deitar tudo por terra é um passatempo interessante. É gratificante podermos levantar da manha e sentir que temos algo infimamente pequeno e de uma importância microscópica, mas mesmo assim sentir que somos uma mais valia neste mundo em que vivemos. Escrever é como dar à luz. Construir uma sucessão lógica de ideias que descreva com exactidão um cenário, ou então construir um poema que transporte amor, tristeza, sofrimento, alegria, algo que tenha vida em sí é um prazer inigualável.
A beleza que subjaz a escrita e leitura é comparável ao de amar e ser-se amado, ao prazer de dar e receber, é a beleza por detrás da máscara, o homem por detrás da carne, é a lua que reflete o sol e a luz serena que nos apazigua. A escrita é simplesmente escrever...
2007/05/07
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