2008/03/05

Sinos, detestas sinos...



Sinos? Ela nunca gostou de sinos. Não tolera nada daquilo que estas pequenas peças de corpo metálico representam. Vê no ecoar severo uma rotina autoritária, um chamamento obrigatório. Ela sempre foi uma amante da imprevisibilidade. Abraçou desde cedo peito alegre do desconhecido. Foi sempre fiel a si mesma. Possui um terno sorriso, um falar dinâmico, parece que para ela é sempre sexta feira, fala com uma alegria contagiante e não hesita um momento para reflectir nos mundos paralelos do que poderia ou não deixar de ser. Tem mãos harmoniosas, talhadas de um castanho escuro lavado. Espelha no andar a determinação e força de espírito que a caracteriza. À falta de melhores adjectivos posso dizer que ela é diferente. Ostenta em si uma luz que esconde um pequeno mas definido brilho. Os olhos confundem-se com a banalidade do amanhecer, mas tem a ternura de um fim de tarde solareiro. É teimosa como uma criança birrenta. Às vezes consegue ser um bocado irritante e chata, mas é-o sempre com uma elegância e naturalidade que a torna encantadora. Acima de tudo é feliz. Partilha com amigos e o mundo em geral aquilo que mais lhe aquece a alma e tem por hábito sorrir com os olhos. Não respeita a falsa virtude da linguagem e liberta as emoções na vulgaridade do calão. À primeira vista ficamos com impressão de se tratar de alguém com má formação, com o passar do tempo reparamos que toda a agressividade, rudeza presente nas palavras que respira não são mais que uma forma de gritar com o mundo. Não é um ser revoltado, mas a sua intempestividade é mais que visivel. Vive rodeada de amigos, raramente se encontra sozinha e quando isso acontece refugia-se na companhia fiel do leitor de mp3. Ao falar a curta distância posso reparar no seu cheiro reconfortante, é uma fragrância que desconheço e não consigo descrever com grande exactidão, é um odor de razoabilidade, desperta no olfato uma sensação harmoniosamente agradável, é um cheiro incisivo. Tem a pele macia, de um agradável toque. O sorriso é um hino à geometria, parece respeitar todas as regras de simetria, os dentes de marfim alegram o mais cabisbaixo transeunte. É de uma bondade impressionante, não hesista em estender o braço. É desconfiada e exagera na quantidade de perguntas quando se perde em algum assunto. Os lábios preenchem um perfeito gradiente entre o castanho da pele e o rosa da parte interna da boca. Tem uma lingua lasciva e utiliza-a frequentemente em sinal de provocação. Mas não gosta de sinos, não gosta da previsibilidade nem acredita no destino. No entanto acredita no para sempre, acredita na existência de um testo para cada panela e a cima de tudo acredita em mim e limita-se a sorrir de forma aparvalhada ao meu olhar perdidamente fixo. Já disse que não gosta de sinos, nem da previsibilidade? Não gosta da musicalidade clerical, mas gosta de mim...