Passa normalmente despercebido. A grande percentagem de gente, aqueles bichinhos bípedes com aspecto erecto, que habita a mágica esfera a que usualmente damos o nome de planeta terra vive num mundo só seu. O ser humano é, desde cedo, sensibilizado para a importância, da necessidade e do prazer que existe na interacção com a natureza. É no entanto curioso que, é igualmente prematura a vontade em se isolar, esquecer o mundo que o rodeia e criar uma virtualização de uma realidade inexistente. O luar. O luar, por exemplo, é algo que todos os dias nos visita e que raramente é cumprimentado. Quantas vezes olharam para o céu e o interpelaram?
-Olá luar como estás?
-Um pouco doente - volta ele soluçando - actualmente ninguém me dá uma palavra de apreço, ninguém quer saber de mim ou daquilo que eu represento. Fico aqui, como uma bola sem rumo a girar como um pião sem saber para que lado cair.
-Pois é deprimente... Antigamente ainda tinhas os gregos que passavam o dia a tentar descobrir se era o sol que girava ou a terra. Nessa altura eras feliz?
-Muito. Apesar das guerras e do sofrimento generalizado do povo havia sempre companhia. É certo que grande parte deles se dirigia a mim para me pedir favores, mas a verdade é que nessa
altura eu existia.
-Agora não existes?
-Não. O Luar só existe a partir do momento em que olham para mim com olhos de querer ver. Muito em semelhança do que se passa com Deus eu só existo pela capacidade que vocês têm em notar a minha presença.
-Sentes-te só?
-Tem dias...
-Há algum dia que te sintas acompanhado? Sim, esses dias são também extremamente infelizes.
-Infelizes? Como assim?
-No dia dos namorados, por exemplo, os namorados costumam-se sentar junto à praia a olhar para mim, é profundamente deprimente. Olham para mim a pensar um no outro.. e fazem isto aos milhões. É como que ter uma plateia de gente a olhar para a tela de cinema que está um metro atrás de ti.
-E como sobrevives tu?
-À custa de lembranças.. Tenho uma idade que vai muito para além dos três dígitos com que tu representas o ano. Já vivi tanto e assisti a tanta coisa que acabo por ver no futuro o espelho do passado. Muito do que se passa agora é um polimorfismo de algo que se passou há anos atrás. O mundo e as pessoas tem uma dinâmica muito parecida com a das ondas. Ora vem, ora vai...
Lá vem um rico que ficou pobre.. lá foi um pobre que ficou rico. Lá vem um país que entrou em guerra... olha acolá mais um tratado de paz. Mas que guerra sanguinária igual à de muitos anos atrás...
-Mas não tens ninguém com quem partilhar...
-Não é bem assim.. Enquanto houver crianças, pequenas mentes ávidas sem veneno de sociedade vai haver sempre um olhar. Uma real vontade de ver. Enquanto tu existires a realidade deixa de ser uma história e passa a ser um futuro.
2010/03/16
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